sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Colóquio artesanal

Ele tinha um gosto desconhecido. E eu lutava contra as minhas pernas, pois elas me guiavam para lugares ancestrais, e no tempo presente eu apenas podia reconhecer o riso gelado de muitas vozes que jogavam para ganhar. Elas me julgavam, por não aceitar o meu comportamento vulgar. Eu vacilava. Flutuava ante a ausência, coisa alguma, que não se poderia explicar a céu aberto. Mas eu precisava respirar. E demorei a me permitir a clausura. Ele tinha um gosto que me lembrava das muitas estrelas desaparecidas do além-mar. Não sabia se estavam mortas, mas reconhecia que não poderia vê-las por muito tempo. Talvez não as visse no quintal, talvez eu sonhasse com a luz de astros que há milênios residiam há milhas do sistema solar. Ele insistia para que eu parasse o sofismar. Iludia-se, eu mal poderia dizer a mim mesma o que esperar. Ele era tudo o que eu poderia querer, pois nada além dos seus olhos era o bastante para me perseguir pelas infindáveis horas do dia, da noite, da alvorada, dos minutos, do nunca mais. Como ele achara tempo para fugir às obrigações do planalto? Seguro-me, pois sou forte e poderia sustentar o cismar de um déspota aterrador. Sobrevivo à falta de ar. Muito mais. Afogo-me quando ele me esconde, de propósito, as águas do mar.