sábado, 29 de novembro de 2008

Self

Eu não sei o meu nome. Por não sabê-lo, assumo variadas identidades. Algumas me perseguem. Persigo-as também. Deixo-as entrar. Elas estão em mim, o tempo todo.
Sou um aglomerado de células nervosas. Às vezes, a afasia é o que sobra de todo este desperdício. Explico-me, mas ao contrário. Afinal, quem entenderia tais divagações? Procuro pelo meu nome. Encontro um espelho. Procuro-te, em seguida, ao lado de uma agenda vazia. Vigio o pequeno lago das águas turmalinas. O que vejo é o reflexo de um ente desconhecido, encimado pelos valorosos segredos do anonimato.

domingo, 16 de novembro de 2008

Vanessa e o Carma

Eu, Vanessa dos mares. Das torres, dos mastros, dos anéis e das montanhas. Eu, que a andar pela noite, a contar amantes que sei, só de olhar, não mais eu verei. Eu a colher ervas e caldos, a escolher sem ponderar. Ao evitar o nada, e contrabandear alucinógenos da natureza. Admito, advirto, todavia: O tempo não existe. Mas não me peça para esperar: De algum modo, não sei te explicar, mas eu sei que o tempo está acabando, mesmo ele não existindo. Em última instância, eu diria, talvez eu nem esteja realmente falando do tempo. Estou me acabando. Estou terminando. Há algo a nascer de mim, e não sei como expressá-lo. Não direi que estou envelhecida. Não o bastante para que eu não me reconheça ao olhar para o espelho. Pelo contrário: Cada vez que olho para mim mesma, sinto que as mudanças externas só reforçam o que eu sou. O que eu estou. O que estou me tornando. Mudo minha vida, mudo o meu cabelo. Mudo as sete cores, a terra roxa e o infinito. Mesmo assim, pedes a mim para esperar. Aquela espera, não diria uma entrega, pois há muita ação envolvida nessa infindável pausa para depuração. Entretanto, existe algo a se derramar, algo está sendo perdido. Pois ao olhar para o reflexo do lago artificial de uma avenida, vejo as flores caírem com muito mais freqüência. E tenho a certeza que é preciso ser alguma coisa. Não digo que há algo a ser feito, pois bem sei que não é preciso fazer nada. É preciso apenas estar. E mesmo para estar é preciso ser alguma coisa. Mudam-se as estações. Qualquer coisa, passageira, qualquer coisa como um barco a se guiar pela direção do vento, sem saber para onde sopra o vento, sem saber para onde gostaria de fazer o vento soprar. Quando eu era menor, ainda cercada pelo amor e pelo carinho da família. Num castelo cercado por quatro paredes. Quando eu era menor, ainda alimentada pela expectativa de ocupar no mundo ilustríssimo lugar. Quando eu era menor, veja bem, eu era muito menor. Jamais entenderia que isto, verde e brilhante que eu bebo, não significa muita coisa além de um líquido que valeria uma boa fotografia. E se alguém olhasse para ela, pensaria no passado, no presente e no futuro. E lembraria coisas que poderiam acontecer no exato momento em que respiraria o ar gelado de um fim de domingo nada promissor. O gosto verde de uma fotografia. Cresço. Mas entenda que o meu crescimento nada tem a ver com a maturidade, com a responsabilidade, com a ética, com a moral. Disso cuidarei junto aos anjos. Assim que me libertares da espera. Levanto-me: A espera é exaustiva. E mesmo que o céu se derrame em lágrimas, rumarei sem norte nem remos. Pois, às vezes, de repente, as correntes simplesmente existirão, e não haverá ninguém para soltá-las. E isso não será bom ou mau. Existirá apenas, assim como as nuvens escuras criadoras das tempestades. Levanto-me. Com ou sem as correntes. E se o tempo existisse, e mesmo se o tempo acabasse, eu estaria acorrentada, sim. A forjar trilhas, a provar para mim mesma que estou andando. Acorrentada, talvez. Ainda assim, a andar. Sou Vanessa, rainha daninha. Um inseto a se debater contra o vidro de um aquário. E sou, dentro disso, o meu melhor. Serei feliz para sempre. E sempre o serei.

sábado, 8 de novembro de 2008

Ana, o Paraíso e a Consolação

Vou pra longe, mar aberto, vou pro porto, pro aconchego. Vou pra onde o Sol não se põe ao término do verão. Onde os homens passeiam sossegados ao cair das tardes preguiçosas. Onde não é preciso dizer coisa alguma, uma vez que existam um olhar e pernas e sorrisos que falam através de seus movimentos. Da espontaneidade. De uma lágrima. Pra que servem as pernas senão para sorrir através dos nossos olhos?!... Sustentam os nossos pés, que, por sua vez, sustentam a própria vida. Vou pra onde exista pranto, pulso, percussão. Palmas, pés, tornozelos e mãos. Talvez eu nem volte mais. Melhor ires comigo, e bem depressa. Se parares para pensar, acordarás e verás que estou perdida, e que tudo isso é muito mais do que um sonho. Quem sabe uma convulsão.

domingo, 2 de novembro de 2008

Naerto:

Não penses que as flores já morreram e que o verão não voltará. Estás imerso no caos e na cobiça dos fracos, mas nada te pode abalar. Nos primórdios deste grande espetáculo, vermes rastejavam no jardim, e o quintal flutuava como bolhas de sabão ao luar exagerado de um jogral. Nada existe além de penas e pernas, tinta fria e automóveis e pés de feijão que ainda não germinaram. Sente tu a vida e acredita na exatidão dos pólos. Agarra-te ao vento e aos faróis do oceano. Reflete o ócio e a brisa. Que poderias a mais desejar enquanto o mundo está, sereno, a se acabar?!... Converte-o em amplidão. E nada te faltará. A porta continua aberta, e não precisas esfregar os teus pés embriagados antes de entrar. Traga apenas a tua presença – inteira e absoluta, e verás que a revolta dos mares é apenas a amplitude dos pólos. Tudo o que sentiste em meio ao pavor de dias e noites intermináveis, tudo isso é amar o que quase se pôde alcançar. Se soubesses o quanto te estimo, sei que ainda assim estarias junto aos anjos andarilhos do norte escuro. Entretanto, talvez ao menos eu tivesse a certeza de que estarias em paz. Olho por ti, Naerto, a última estrela do céu, morta e exposta às multidões por anos e anos e desertos. Serias feliz?!...